Cruzeiros.
Os Cruzeiros
Os Cruzeiros
Existem, dispersos pelo limite territorial desta
freguesia, cerca de uma vintena de cruzeiros, alguns votivos, convidando à
oração, outros a evocar factos ou acontecimentos na sua maioria trágicos, que
sendo reais e históricos, apenas constam na tradição e na memória dos mais
velhos que receberam essa informação dos seus ascendentes e que por sua vez a
vêm transmitindo aos mais novos.
A história de um povo, ainda que não escrita, faz-se pela
tradição oral, contudo há monumentos que podendo testemunhar essa história de
um modo real, são destruídos ou votados ao desleixo, e no caso presente dos
cruzeiros isso é verdade, pois eles, sendo pedaços da nossa história, trazem
até nós a lembrança de algo que aconteceu no passado, porém uma vez destruídos,
é também destruída e apagada a fonte viva desse mesmo passado.
Vários desses cruzeiros desapareceram, outros jazem por
terra em pedaços como vulgares pedras mortas, esquecendo-nos que cada um deles,
representa um acontecimento cuja memória é preciso preservar e transmitir à
posteridade.
Um povo, se quer ver respeitados no futuro os seus feitos,
terá que primeiro respeitar a memória, os vestígios ou atestados da vivência
que os antepassados lhe legaram aquando da sua passagem, só respeitando se
merece respeito, além disso esse mesmo povo será grande, tanto na medida em que
é capaz de construir o seu futuro, como na capacidade que tiver de preservar e
transmitir para os vindouros os valores, sejam morais ou materiais que os seus
ancestrais lhe transmitiram.
Não pretendo fazer acusações, nem imputar
responsabilidades a ninguém sobre a delapidação do nosso esparso património
histórico, mas sim sensibilizar todos os cidadãos, para o dever, a que se não
devem furtar, de zelar pelo passado que nos é legado e que afinal é de todos
nós, Soitenses do presente mas também do futuro.
O grau de importância de um monumento pode variar conforme
a época ou a mentalidade das gentes, e o que ontem não teve valor pode tê-lo
amanhã, assim creio que todos devemos contribuir para a recuperação e
manutenção dos cruzeiros, não com ajudas materiais, mas sim com o respeito que
é devido à memória daqueles que os ergueram, sabendo mantê-los de pé.
O Cruzeiro do Calvário
Estava colocado a um canto do Calvário do lado Noroeste e
data de 1714, sendo de crer que já existia, ali ou em local próximo, aquando da
construção do Calvário que pode datar de finais do século XVIII à semelhança do
que acontece com os nichos da Via-Sacra
Este Cruzeiro, que teria sido transferido de lugar, quando
se construiu o Calvário, ou ali colocado após a construção deste, tem na parte
inferior, talhado no granito, o símbolo da morte: a caveira e dois ossos
cruzados e na parte superior pode ler-se a inscrição INRI. Foi colocado ao
centro do Calvário em 2007.
O Cruzeiro da
Francesa,
Situado na Marsoba no antigo
caminho de Aldeia da Dona, a escassos metros da estrada de Alfaiates, é datado
de 1879: Consta que neste local foi morta uma cidadã Francesa que acompanhava
as tropas do seu País aquando das invasões de 1808/1814, e que por ali se
deslocavam.
Talvez por estas terem saqueado o
Soito e assassinado mais de duas dezenas dos seus moradores, os restantes
habitantes revoltados se tivessem vingado da afronta que sofreram perseguindo
os franceses e então tivessem morto esta cidadã.
Cruzeiro de
João Namoros
Colocado no cruzamento de Nossa
Senhora de Fátima com o antigo caminho de Vila Boa, local conhecido pelos mais velhos
como Castanheiros de João Namoros. Este cruzeiro é datado de 1919, mas sabemos
pela tradição verbal que tem sido transmitida de pais a filhos, que este
acontecimento teve lugar talvez há mais de século e meio, já que pessoas há
muito falecidas diziam ter ouvido tal testemunho aos seus pais que por sua vez
já o tinham recebido dos seus.
Conta a historia que um moço do
Soito namorava em Vila Boa talvez contrariando a vontade dos pais, e que numa
bela noite, como o teria feito já outras mais, colocou um molho de palha
debaixo das mantas para que os pais não dessem por falta dele e aí vai ele
caminho fora ver a sua amada.
Nessa trágica noite, a mãe
acordou atormentada por um sonho no qual via o filho a ser devorado pelos
lobos, aflita clama para que o marido vá ver se o filho está deitado, o homem
lá foi e sob a luz ténue de alguma candeia, olhou para a loja através do
alçapão, viu que estava na cama e regressou descansado ao seu leito.
Passado pouco tempo o sonho
continuou e ela volta a chamar pelo marido que resolve ir certificar-se, mas ao
afastar as mantas vê com surpresa que no lugar do filho estava apenas a palha
enganadora.
Temeroso já do que estivesse a
acontecer, cela à pressa o seu cavalo e monta a todo o galope em busca do
filho, a alguma distancia ouve o alarido do ataque dos lobos e diz em voz
forte; tem-te filho que aqui vou eu, mas quando chegou ao dito local já era
tarde e só encontrou as botas do filho.
Os terrenos
envolventes oficialmente conhecidos como Jastais não impediram que a este lugar
fosse dado o nome de “Castanheiros de João d’Amores” em memória de tão trágico
acontecimento, mas o povo vai esquecendo o facto e desde há alguns anos, com a
colocação de uma imagem de Nossa Senhora de Fátima quase em frente, este nome
está a substituir aquele que inevitavelmente passará ao esquecimento.
Cruzeiro
do Ti Dora
Este Cruzeiro do qual não
conseguimos decifrar datas, está situado do lado esquerdo, na estrada que segue
para Alfaiates, mas o seu local até à retificação do atual traçado da estrada,
era uns 50 a 60 metros para noroeste na antiga estrada, hoje terreno
particular. Chamado de Cruzeiro do Ti Dora, lembra a memória de um Soitense, de
apelido Dora, (apelido que viria do pai, já que o irmão José, nascido 3 anos
depois também foi apelidado de Dora e tem descendência) mas cujo nome era
Manuel Lopes, que ali perdeu a vida no dia 3 de Maio de 1888 às cinco horas da
tarde, assassinado, aquando das disputas com os vizinhos de Alfaiates pela
posse dos terrenos fronteiriços às duas freguesias. Embora o assento de óbito
diga que tinha 28 anos a verdade é que o assento de casamento de 8 de Maio de
1886, diz que tinha 29 anos, pois foi batizado no dia 29 de Março de 1857, filho
de João Lopes e de Maria Gomes. Casou com Isabel Maria Nunes e teve um filho:
José Augusto Lopes que teve descendência ainda hoje presente.
Este cruzeiro lembra as desordens
acontecidas durante décadas e que opunha o Soito e Alfaiates a propósito da
posse do Vilares e da Marsoba e que só viriam a terminar em fins do século XIX
ou princípios do século XX após o derramamento do sangue de alguns homens,
tanto do lado do Soito como do lado de Alfaiates.
Cruzeiro
do Tio José Augusto
Situado no lado direito, no caminho
que conduz do Robalbo à ponte da Granja, este Cruzeiro lembra a intolerância, a
prepotência e o negativismo das forças da ordem de então e da lei que as regia,
assim como o baixo conceito em que era tida a vida humana num país que havia
sido o primeiro da Europa a abolir a pena de morte mas que na prática, a ela
condenava sem julgamento.
Ali foi assassinado pelas forças
da Guarda Republicana, José Augusto Ventura, em 27 de Agosto de 1954 quando
transportava odres de azeite no seu cavalo, destinados ao comércio afim de por
este meio poder subsistir, ele e a família.
Mandado parar pelos agentes, não
obedeceu, certo de que lhe seria apreendido o produto que transportava mais o
cavalo, podendo também ir preso caso fosse apanhado, em resultado do não acatamento
da ordem de parar, foi alvejado com as balas mortíferas da autoridade e morto
sem julgamento, tendo como único crime o facto de procurar sustento para si e
para os seus.
Este acontecimento foi motivo de
indignação dos populares, que à hora do funeral queriam passar pela porta do
Posto da GNR mostrar o produto da desumanidade dos guardas, estes já precavidos
e apoiados com reforços vindos de outros quartéis, estavam preparados e com
metralhadoras apontadas ao cortejo e não hesitariam em disparar sobre pessoas pacíficas
e desarmadas.
Disse alguém, que o autor de tal
crime foi transferido e como “prémio” pelo mal que fizera, havia sido
promovido.
Cruzeiro
das Teixugueiras Estrada do Osendo
Ouvi dizer a pessoas que já
deixaram o mundo dos vivos, que neste local foi morto um homem que passava na
hora errada e que talvez tivesse sido morto por engano.
Neste local, a escassos cem
metros do São Cristóvão, porque havia muitas flores, foram colocadas várias
colmeias para as abelhas produzirem o precioso mel, acontece que quando os
proprietários iam fazer a colheita o mel já havia sido misteriosamente
retirado.
Porque o prejuízo era grande e
não era tempo de desperdiçar, os donos fazem vigia no sentido de apanhar o
ladrão de mel.
Uma noite passava este homem de
nome José Augusto Pereira pelo local e com ou sem culpa, pagou com a vida por
um crime que não merecia tão pesada e arbitrária pena.
Conforme se pode ler no Cruzeiro,
este acto deu-se em 1 de Julho de 1908. Foi encontrado morto pela 4 horas da
manhã e foi a enterrar no cemitério público do Sabugal.
Cruzeiro
do Ti Bola
Este Cruzeiro já desaparecido talvez
quando do alargamento do caminho pela Engenharia Militar depois de 1975, existiu
no alto da Cabeça da Vaca em sinal da morte de um habitante do Soito em
Quadrazais.
Diz quem o ouviu aos mais idosos,
que esse Soitense, foi a Quadrazais a casa de uma filha ali casada e que por
razão desconhecida faleceu de repente.
Foi trazido pelo povo de
Quadrazais em cortejo fúnebre até esse local, onde era esperado pelo povo do
Soito que deles o recebeu e o trouxe para lhe prestar as últimas homenagens e
fazer o funeral.
Cruzeiro
do Pires
Ainda há poucos anos se erguia no
sitio do Carriçal o Cruzeiro chamado do Pires e datado dos tempos das disputas
dos Vilares, entre o Soito e Alfaiates, diz quem sabe que esse cidadão de
Alfaiates munido de uma pistola se deslocava para este local dizendo que vinha
matar os do Soito, acontece que esgotadas as balas sem que acertasse em alguém,
se virou o feitiço contra o feiticeiro, e de seguida foi acometido por um homem
apelidado de Espanhol que ali mesmo o deixou morto, não sem que antes jogasse à
barra com ele como se fora uma pedra.
Outros
Cruzeiros
No cruzamento da Estrada de
Quadrazais com o Caminho do Ribeiro do Bispo existe um dos mais antigos; 1878,
no entanto não me foi possível obter qualquer facto a ele alusivo.
Em frente ao depósito da água e
datado de 1891, encontra-se um cruzeiro que foi derrubado e partido ainda há
pouco tempo mas de novo levantado embora noutro local do lado oposto ao primitivo.
Em Santo Amaro junto à última
casa a fazer gaveto entre duas ruas e com data também de 1891.
No sítio da Moita da Cruz, na
junção dos dois caminhos que vão de Santo Amaro e do Robalbo está um cruzeiro
que após vários anos caído e partido, se encontra agora a cumprir a missão para
a qual ali foi colocado, a data é possivelmente de 1891, contudo o ultimo
algarismo já se encontra-se ilegível.
Outro ao Carvalhal, sem data, é
mais um marco da fé dos nossos antepassados.
Mais um junto ao Chafariz dos
Lameiros, mas também sem datas.
Outro na Pevide sem data e
encimado por uma cruz de ferro.
No antigo caminho de Alfaiates que
segue pelo Janadão, ergue-se um Cruzeiro conhecido como Cruzeiro do Luís Pedro
e é diferente de todos os outros, tem na parte superior uma cruz cinzelada. Também
não se lhe encontram quaisquer inscrições.
Mais um no entroncamento de
caminhos no Espadanal e datado de 1949.
No Caminho de Aldeia Velha, onde
entronca o caminho do Carriçal, com data 1950.
No mesmo caminho e que cruza
aproximadamente no sítio da Lapa, é de 1951.
Na barreira sobranceira á Ponte
da Granja, datado de 1892...? e onde se pode ler apesar da erosão de que vai
sofrendo a pedra: OVÓS QUIDES RS PN AVP.
Será um convite à oração?
Um pedaço assente, como se
simples pedra de granito fosse, no Chafariz dos Lameiros e que certamente foi
trazido do seu verdadeiro local, hoje talvez desconhecido.
Ainda outro pedaço, este com data
de 1843, o mais antigo depois da cruz do calvário e que se encontra assente a
fazer já parte da parede, à esquerda do começo da Rua de Trás de Soito junto à
placa de STOP frente ao Lameiro do Soito.
Caído, partido e certamente fora
do seu local, estava, ainda há pouco tempo, junto à casa do Sr. Padre José
Miguel um cruzeiro à espera que lhe seja dado um lugar.
Numa casa demolida em 2001, junto
à Padaria de baixo e que pertenceu, por herança, a Maria Martins, logo com mais
de 200 anos, encontramos parte de uma cruz que fazia parede como se fosse uma
vulgar pedra.
Outro a servir de ombreira na
porta número 6 da Rua do Pereiro
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